quarta-feira, 24 de junho de 2015

Fibrose Cística

Definição
É uma doença genética multissistêmica. autossômica recessiva, que leva a um defeito de um canal transmembrana condutor de cloreto, presente em vários epitélios de glândulas exócrinas do organismo. O resultado é a disfunção desses epitélios, caracterizada pela incapacidade de secretar íon cloreto em resposta ao AMP cíclico. O quadro clínico é marcado por infecções recorrentes das vias aéreas, insuficiência pancreática (principal causa na infância) e elevada concentração de cloreto no suor.

Epidemiologia
A incidência varia de 1:2000-5000. A expectativa de vida gira em torno dos 35 anos, a despeito de atenção médica. No Brasil, alguns estados incorporaram a triagem neonatal para a doença no teste do pezinho (Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina). Infelizmente, como não há triagem universal, a média do diagnóstico fica ao redor dos 4 anos.

Fisiopatologia
Existem mais de 1400 mutações no canal de cloreto (CFTR - cystic fibrosis transmembrane regulator), que podem levar a ausência da síntese, bloqueio de processamento, bloqueio na regulação, condutância alterada ou redução da síntese. Essa ampla variedade genotípica leva a um espectro muito amplo de fenótipos, que vão desde a uma doença muito grave a uma doença leve que vai se manifestar apenas na adolescência.

Clínica
Respiratória

  • Superior
    • Sinusite, pólipos
  • Inferior
    • Infecções de repetição
    • Bronquiolite
    • Pneumonias
    • Bronquiectasias
    • Bronquite
    • Atelectasias
    • Aspergilose broncopulmonar alérgica
    • Cor pulmonale
OBS: sabe-se que a função pulmonar é inversamente proporcional à expectativa de vida. Declina com a evolução da doença, e está associada ao aparecimento das infecções de repetição. O diagnóstico precoce dessas infecções pode ajudar a frear o declínio da função pulmonar, e portanto, aumentar a expectativa de vida. Assim, exames complementares são necessários e solicitados periodicamente na tentativa de detectar precocemente e tratar de forma oportuna essas infecções. O exame de escarro deve ser realizado em todas as consultas; a espirometria a cada 6 meses, e a TC de tórax a cada 2 anos.

Gastrointestinal
  • Cerca de 20% das crianças com fibrose cística apresenta obstrução intestinal neonatal por íleo meconial (mecônio espesso). 
  • Algumas podem apresentar perfuração intestinal ainda no período intraútero e desenvolver um quadro de peritonite meconial, detectado após o nascimento pela presença de calcificações peritoniais e de escroto visíveis na radiografia abdominal.
  • 85% evolui com síndrome disabsortiva por insuficiência pancreática exócrina, com todos comemorativos da mesma: esteatorréia, desnutrição, deficiência de vitaminas ADEK (lipossolúveis). Com a evolução da doença, insuficiência do pâncreas endócrino também pode surgir, com hiperglicemia, glicosúria e poliúria ("diabetes mellitus relacionado à fibrose cística").
  • 30% dos adolescentes em torno de 15 anos manifestam sintomas de disfunção hepática.
  • 2-3% evolui com cirrose biliar
  • 20% das crianças entre 6-36 meses apresentará prolapso retal. 
  • Outras condições associadas: intussuscepção, volvo, apendicite, atresia intestinal, refluxo gastroesofágico e colelitíase
Glândulas sudoríparas: excessivas perdas de sal através da pele, que pode levar à hiponatremia, especialmente durante episódios de gastroenterite e temperaturas elevadas. Também podem desenvolver alcalose hipoclorêmica.

Diagnóstico
O teste do suor é o padrão-ouro, pois possui alta sensibilidade e especificidade e baixo custo. Consiste na dosagem do cloreto no suor, pelo método da iontoforese, através da estimulação com pilocarpina durante 30 minutos. O teste é positivo quando a concentração de cloreto for maior que 60mEq/L. Níveis inferiores a 40 mEq/L são normais, e valores entre 40-60 mEq/L são considerados duvidosos, devendo ser repetidos. Resultados falso-positivos podem ser encontrados em insuficiência adrenal, hipoparatireoidismo, hipotireoidismo, diabetes insipidus, síndrome nefrótica, pan-hipopituitarismo e mucopolissacaridoses. Por outro lado, falso-negativos podem ser observados em condições como edema e hipoproteinemia.

Tratamento
  1. Vacinas: antipneumocócica, anti-influenza e anti-varicela.
  2. Antibioticoterapia: a indicação formal de início de ATB é diante da presença de sinais e sintomas de exacerbação: febre, piora do estado geral, piora da tosse, escarro purulento, anorexia, intolerância ao exercício, taquipnéia, hemoptise, fadiga ou sonolência. Piora na ausculta, radiografia ou VEF1 também são considerados. Outras duas condições além das exacerbações indicam ATB -> 1)colonização de orofaringe positiva e anticorpos séricos aumentados para Pseudomonas aeruginosa e 2) pacientes colonizados cronicamente com S. aureus e Pseudomonas. Frente a uma exacerbação em um paciente colonizado por esses germes, está indicada internação para realização de ATB venoso por 14-21 dias com oxacilina + amicacina + ceftazidima.
  3. Mucolíticos: os mais estudados são aqueles à base de DNAse recombinante, que tornam o muco mais fluido.
  4. Nebulização com salina a 7% 4x/dia. O salbutamol em spray oral pode ser administrado antes das nebulizações.
  5. Lipase recombinante: substitui a lipase pancreática, ausente na doença. A dose recomendada é de 1.000 unidades/kg por refeição. A maioria das formulações para terapia de reposição contém lipase junto com protease e amilase. Dependendo do grau de déficit nutricional pode ser necessária a reposição de vitaminas lipossolúveis

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